Nos últimos dias o tema aborto como crime voltou aos noticiários do país que se surpreendeu com o projeto de lei 1.904/24, o qual visa aumentar a pena de mulheres que fizerem um aborto, mesmo nos casos em que a lei já excepciona - em caso de estupro ou quando há risco de morte da mulher ou anencefalia fetal - após a vigésima semana de gravidez.
Tal projeto de lei é um absurdo jurídico, pois além de faticamente equiparar a pena do aborto a de crimes como o homicídio e torna-la quase o dobro da pena do próprio estuprador, fere gravemente vários princípios constitucionais, tais como o princípio da proporcionalidade da pena e o da razoabilidade, o que torna inconstitucional desde a sua origem.
Além disso, criminalizar a vítima de estupro, seja em que momento for, é um retrocesso social, pois joga por terra avanços significativos no reconhecimento de que a vítima de estupro não pode jamais ser a culpada pela violência que sofreu.
Tem-se ainda a questão da maturidade pouco desenvolvida de muitas das meninas que engravidam ainda na adolescência ou até mesmo na infância em virtude de estupros, das quais, certamente, não se pode cobrar a responsabilidade de ter um prazo determinado de vinte e duas semanas para decidirem se querem levar a frente uma gravidez com essa origem.
Não há dúvida de que cabe ao Estado impor limites à liberdade individual de todos nós, isso é um pressuposto básico de qualquer sociedade organizada e civilizada, mas daí a criminalizar a própria vítima de um crime há um abismo de machismo e ignorância enorme que não se pode tolerar em um Estado Democrático de Direito como é o Brasil de hoje.
Assim, seja pelo fato de que socialmente será um retrocesso no combate á cultura do estupro, seja pelo fato de que é juridicamente inconstitucional, a vítima não deve ser responsabilizada criminalmente se decidir, nos casos já autorizados por lei, abortar, independentemente de quando assim o fizer.
Vamos acompanhar como o Congresso Nacional decidirá o delicado e importantissímo tema.
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